Home MEDIO AMBIENTE ‘Há dias em que a escola fecha porque as crianças não têm...

‘Há dias em que a escola fecha porque as crianças não têm água para beber’ – Isto é um colapso climático | Brasil

12
0


Veja mais da série
  • Localização São João das Missões, Brazil

  • Desastre Seca na Terra Indígena Xakriabá, 2013-24

José Fiuza Xakriabá cresceu na comunidade indígena Xakriabá território e é agora um influente líder Xakriabá. Essa região foi anteriormente regado por uma extensa rede de rios. Mas o único riacho que ainda flui na área circundante é agora o Itacarambi. A tendência de aumento da seca em Minas Gerais estado começou na década de 1970 e é causada pelo aumento das temperaturas. A pesquisa científica mostrou que secas foram os pior em pelo menos 700 anos e são principalmente o resultado do aquecimento global causado pelo homem.

Nunca desisti da minha terra, que para mim é o mundo onde nasci e cresci. Meu pai é daqui; minha mãe é daqui. A primeira casa com telhado de telha em que moramos está aqui, ao meu lado. Antes morávamos em casas de palha, palha, casca de alho, madeira. Sempre foi assim.

José Fiuza Xakriabá Fotografia: Sylvia Gosztonyi

Até a década de 1960 choveu muito. Os tempos eram bons. Comemos muito. Caça selvagem, peixe. Havia muitos rios. Mas desde então eles estão secando. Se eu tentasse contar as fontes que já secaram, não tenho certeza se conseguiria.

Nossa terra não é apenas esta cordilheira. Estávamos cercados. Nossos mais velhos tinham as margens do Rio São Francisco para caminhar, e a entrada era em Remanso e Fabião, onde criaram o Jacaré. Alguns chamam de Jacaré, outros de Gandu, mas hoje é Itacarambi.

Só em 1979 é que esse pedacinho de terra aqui foi demarcado. Mesmo agora, você pode ver nas áreas ao nosso redor que os não-indígenas não acreditam que esta terra seja nossa. A terra deles está registrada e nós respeitamos isso. Mas não podemos entrar lá nem para colher uma única folha de uma árvore.

Uma fotografia de drone mostra um incêndio que tomou conta de uma área verde em Manaus, Amazonas, Brasil. Fotografia: Raphael Alves/EPA

Estamos vivendo uma seca que já dura mais de 10 anos. Há muito pouca chuva. Parece que está diminuindo a cada ano. Nosso pequeno pedaço de terra não é mais suficiente para sobrevivermos. Hoje temos que trabalhar ainda mais na terra porque muitas vezes não ganhamos nada com ela. Às vezes, alguém tem sorte com o plantio e ganha alguma coisa com isso, mas tem sido difícil. Este ano já semeei a minha terra mas não consegui nada. Devemos esperar que chova, semear novamente e criar uma galinha ou um porco.

Claro, podemos comprar alimentos processados, mas isso é comida doente. O café está doente, o açúcar está doente, o arroz está doente, o feijão está doente – tudo o que consumimos hoje está doente. Até alguns anos atrás, só sabíamos do veneno que usavam na lavoura externa. Mas hoje somos obrigados a usá-lo nós mesmos com algumas plantas, porque tudo é muito mais difícil.

Esse clima muito quente e seco nos traz mil e um problemas de saúde. Saímos para o mato, onde pegamos remédios, e vemos morrendo as árvores mais antigas: o pequi, o pé da favela, o pau-terra, o jatobá, a sucupira.

Sobre a série

Esta análise climática foi elaborada em colaboração com o Projeto de Desastres Climáticos da Universidade de Victoria, no Canadá, e a Cruz Vermelha Internacional. Leia mais.

Equipe de produção

Quando um indígena estava no comando da região de São João das Missões, ajudou muito. Construíram um poço e uma barragem. Mas ainda não foi suficiente. A água da barragem está muito baixa. Estamos perfurando em todos os lugares para encontrar água. E dissemos aos nossos jovens que existe o risco de perfurarmos o solo e não encontrarmos mais água.

Houve racionamento porque há muito pouca água para consumir. Há dias em que a escola fecha porque as crianças não têm água para beber e em que as mulheres têm que descer até o Rio Itacarambi para lavar roupa e tomar banho. Há muito pouca água, mas é alguma coisa. As nascentes da cabeceira da reserva, a Pindaíba, a Pedrinha e a Lagoinha, secaram. Existe apenas um rio seco.

Até o Chico está morrendo. Mas a culpa não é dos Xakriabá. A culpa é dos grandes empresários, que só pensam em destruir a terra, acabar com as florestas, acreditando que a terra sobreviverá sem elas. Mas não sobreviverá. A terra está morrendo porque o próprio homem a está matando.

Barco encalhado no Rio Negro, no porto de Manaus, Amazonas, Brasil. Photograph: Edmar Barros/AP

Nosso sonho era recuperar pelo menos um pedacinho do nosso rio, o São Francisco, para tentar levar a água de lá para a serra aqui, para pelo menos parte da reserva. Nossas crianças acreditam que podem morrer de sede a qualquer momento, às vezes, quando não encontram nada para comer ou beber. Muitos jovens pensam em cometer suicídio. Acredito que, com o rio, eles pensariam: “OK, estamos com sede aqui, mas vamos descer até a margem do São Francisco. Há água e peixes lá.”

Esperamos que Deus [the word for God in the Tupi and Guarani languages] nunca morreu e nunca morrerá. E que ele ainda pode melhorar o clima. Mas o homem precisa fazer a sua parte, parar tanto desmatamento, parar a guerra, parar de matar inocentes, porque no Brasil são os negros e indígenas que mais morrem, porque são inocentes.

Meu pai dizia: “A gente só para de lutar ou de batalhar pelo que é nosso quando morre”. A herança indígena é uma luta e não deixaremos de lutar pelo que é nosso. Temos que viver.

  • Editado por Ricardo Garcia, Cristine Gerk, Aldyn Chwelos, Sean Holman. Traduzido por James Jovem. Design e desenvolvimento por Harry Fischer e Pip Lev



Source link

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here